Bufetes e máquinas de venda automática são um "contra-senso"
É precisamente aqui que as duas nutricionistas ouvidas pela página concordam que reside a fonte do problema. Tendo em conta que as cantinas apresentam níveis bastante satisfatórios de qualidade nutricional, é pelos bufetes e pelas máquinas de venda automática instaladas nas escolas – que vão sendo uma fonte de rendimento acrescido para os depauperados orçamentos escolares - que deve passar a mudança. "Não consigo perceber como é que as escolas continuam a oferecer nos bufetes e nas máquinas de venda automática os mesmos produtos que os professores dizem na sala de aula que não devem ser consumidos. Isto é o maior contra-senso que pode haver", diz Paula Veloso, ex-professora e nutricionista clínica (ler entrevista nas páginas 11 a 13). Bela Franchini, por seu lado, afirma que a solução não passa por retirar as máquinas das escolas mas sim "ter em atenção o que se disponibiliza". Em último caso, "os órgãos de gestão das escolas é que devem decidir o seu conteúdo", acrescenta. Neste domínio, a Secretaria Regional de Educação da Madeira deu um bom exemplo ao implementar a denominada "Rede de Bufetes Saudáveis Escolares". Este projecto, que teve início em 2001/2002 e é actualmente aplicado de forma voluntária em vinte escolas, pretende "regulamentar" de forma pedagógica a oferta alimentar disponibilizada nestes espaços, envolvendo os alunos na definição das ementas e na própria preparação dos produtos. De resto, a oferta alimentar nos infantários públicos e nas escolas do 1º ciclo do ensino básico do arquipélago é, desde há algum tempo, acompanhada por nutricionistas que emitem normas orientadoras adequadas a cada ciclo, a que se juntam iniciativas no sentido de incentivar as escolas do 2º e 3º ciclos e ensino secundário a desenvolverem programas de Educação Alimentar. Já no continente, as escolas passaram recentemente a dispor de indicações sobre a alimentação que deve ser fornecida aos alunos nos bufetes através do "Referencial para uma Oferta Alimentar Saudável", publicado pela Direcção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular, elaborado em parceria com a Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto, a Deco e o Instituto do Consumidor. Entre os alimentos recomendados neste documento, que brevemente será seguido de outros mais específicos, nomeadamente aplicados às ementas das cantinas, destacam-se o leite e os iogurtes meio-gordos ou magros, os sumos de frutas naturais, o pão feito a partir de farinhas pouco refinadas, a fruta fresca da época e os produtos hortícolas. Entre os géneros alimentícios a não disponibilizar salientam-se os fritos (rissóis, croquetes, pastéis de massa folhada), os produtos de charcutaria ricos em lípidos e sal (chouriço, salsicha, mortadela, entre outros), os refrigerantes, as batatas fritas, os hambúrgueres, os cachorros quentes, as pizzas e as guloseimas. De acordo com as recomendações constantes neste referencial, os bufetes deverão constituir-se como um espaço complementar e não como alternativa ao refeitório escolar. Para que tal não aconteça, as escolas devem oferecer refeições não só equilibradas do ponto de vista nutricional mas também agradáveis e apelativas, de modo a contrariar o apelo das refeições "fast-food". "A médio prazo será a vez das cantinas. Mesmo quando nutricionalmente equilibradas, muitas das ementas deverão, a meu ver, ser revistas, porque não satisfazem o paladar dos alunos", diz Paula Veloso, que sugere a criação de "equipas multidisciplinares" que possam construir "referenciais que não se limitem a servir de meras sugestões técnicas".